Nota do grupo “Além do Mito...” sobre o aumento das passagens
O aumento do valor das passagens do transporte público na cidade de Maceió já se tornou algo tão corriqueiro que pode passar a ser incluído em nossos calendários. Toda primeira semana de janeiro somos presenteados por nossos governantes com aumentos abusivos que são, via de regra, muito mal combatidos pelos movimentos sociais do município.
No entanto, o início do ano de 2010 representou uma novidade, qual seja, o famigerado aumento anunciado para os primeiros dias do ano foi adiado pelo prefeito Cícero Almeida para o final do primeiro semestre. Adiamento este que representa interesses políticos, não preocupações com a sociedade alagoana.
Tão corriqueiro quanto os abusivos aumentos anuais são as ações perpetradas para se “combater” tais aumentos. É fato que as datas em que são marcados estes reajustes pegam desprevenidos os movimentos sociais e dificultam a resposta imediata de tais grupos perante os abusos da prefeitura. Contudo, por vezes, este argumento é colocado como causa mor, ocultando o que representa, ao nosso ver, uma das causas determinantes da esterilidade dos enfrentamentos passados: o praticismo em que está imerso o movimento, impossibilitando tanto uma articulação orgânica prévia aos aumentos quanto a manutenção de um debate posterior a estes. E como que fechando o círculo, esse praticismo acaba dificultando uma análise mais aprofundada e detida das copiosas derrotas sofridas em manifestações anteriores.
Junto a isso, enxergamos como dificuldade central o fato de que as mobilizações se dão sem uma necessária discussão com a base. Parte-se do ponto de que é necessário organizar um ato e então se viabilizam, minimamente, as condições para que o mesmo ocorra. Os comitês contra o aumento das passagens formados até então não discutem formas de como dialogar com a população, como discutir de forma efetiva com os trabalhadores a questão e como publicizar melhor o próprio comitê e sua pauta para que outras forças se somem e consolidem a manifestação como uma luta comum e em prol da sociedade. Então, de forma extremamente imediatista, forças políticas se aglomeram em torno de um comitê ineficiente após o aumento já ter ocorrido ou então às vésperas do mesmo ocorrer, na maior parte das vezes contando com a participação hegemônica de entidades estudantis e escassa participação de sindicatos e outras entidades representativas. Como conseqüência os espaços de atuação acabam se tornando locais privilegiados para a pura divulgação de partidos e organizações políticas que acabam por colocar seus interesses à frente dos interesses do movimento, esvaziando a preocupação com o transporte público de suas falas.
Nos últimos comitês que participamos constatamos todos esses problemas que, verdadeiramente, emperram qualquer processo de luta efetiva e nos propusemos a levar a discussão para a população e agir de forma mais conseqüente - proposta compartilhada inclusive com organizações minoritárias dentro do último comitê. Contudo, o que ocorreu foi um esvaziamento dos comitês por parte das forças políticas que os compunham.
Esse ano, como já mencionamos, contamos com o diferencial do adiamento da alteração do valor das passagens, o que - se não modifica em nada o caráter da administração pública e dos empresários de Maceió, preocupados unicamente com o lucro de suas empresas - dá ao mesmo tempo àqueles que se opõem aos abusos no transporte público uma grande oportunidade para uma organização mais concisa e mais possibilitada a frear os interesses da máfia dos transportes.
Vemos então a necessidade urgente de se convocar um novo comitê, em marcos diferenciados do que os que vinham se dando anteriormente, chamando à luta todos aqueles que não agüentam mais os aumentos ultrajantes e os ataques dos monopolizadores do transporte público. Reconhecemos a flagrante necessidade dele se pautar pelo intenso debate entre os grupos que o comporá e destes com o restante da população, no sentido de um efetivo trabalho de base, para que, aí sim, a população possa se reconhecer nesse movimento e passar a construí-lo. Não podemos recair no erro de transmitir a aparência de um movimento unicamente estudantil. A luta contra as intempéries da administração pública deve ser travada por todos os setores populares, vítimas dos abusos e arbitrariedades do Estado. Vislumbramos, portanto, a necessidade de uma unidade dos movimentos estudantil e dos trabalhadores em geral, que possa excluir a vaidade das forças políticas que nela se aglutinem, com fins de viabilizar a formação de um conseqüente processo de lutas. Pugnamos um movimento de resistência e não meramente um movimento de exceção.
O adiamento da sanção por parte do chefe do executivo municipal fornece aos movimentos sociais um elemento objetivo de extrema importância. Agora temos meses para travar o diálogo e preparar as forças para barrar o aumento. Porém, ressaltamos, esse diálogo deverá responder às reais necessidades do momento histórico. Uma das grandes características do praticismo supra-referido é a incapacidade de leitura e compreensão da processualidade do real e a conseqüente falha na escolha dos instrumentos de luta. Por isso, entendemos que o desenvolvimento desse diálogo e desse trabalho de base é que devem sustentar um comitê, definindo sua organização e atuação. Os instrumentos de luta nascem a partir do efetivo movimento das massas, porque se assim não for, corre-se o risco de apoiar-se no vazio.
Consideramos algumas atividades como concretização necessária de nossas propostas, tais como: o permanente estudo sobre a realidade do transporte público em nossa capital, bem como a comparação com a realidade de outras cidades; a realização de espaços de discussão nas universidades, escolas, sindicatos, associação de bairro, tais como seminários, grupos de trabalho e exibição de documentários. Além de panfletagem nos coletivos e pontos de ônibus como forma de despertar o debate na população em geral, usuários desse meio de transporte.
Nesta linha, convocamos todas as organizações, forças políticas, grupos e indivíduos que estejam dispostos a firmar um compromisso com a luta conseqüente e determinada na defesa dos interesses das classes exploradas para estarem dia 9 de fevereiro, às 14h, na Residência Universitária Alagoana para realizarmos nossa primeira reunião enquanto frente de luta contra o aumento das passagens, debatendo quais passos daremos no caminho da resistência a tais abusos.
Grupo Além do Mito